Você já reparou que existe muito mais da Alemanha no nosso dia-a-dia do que percebemos? Por exemplo, essas músicas típicas da cultura urbana brazuca são um ótimo exemplo. Quer ver?
Olha, todos exemplos aqui são apenas links externos para vídeos de YouTube. Se você notar que algum link quebrou, deixe um recado nos comentários, tudo bem?
Chega de enrolação, vamos direto ao que interessa: a música!
Tã-tã-tã-tããããã
Outro dia, eu conversava descontraidamente com uma senhorinha atendente do supermercado enquanto ela passava as compras.
Enquanto passava os produtos, ela me contava um causo qualquer que tinha acontecido com ela naqueles dias. Lá pelas tantas, para tentar criar um suspense, ela fez uma pausa microscópica na fala e soltou um »tã-tã-tã-tããã!«.
Depois que paguei as compras e fui embora, fiquei me perguntando se a atendente de supermercado do meu bairro sabia que estava citando a 5ª Sinfônia de Beethoven…
Ou vai ver que ela estivesse citando a trilha sonora da propaganda política do PRONA – partido falecido nos inícios dos anos 2000. Não. Ninguém faria isso em sã consciência.
Baile dos passarinhos
Se você conhece essa musiquinha pelo
Balão Mágico,
Gugu ou
Patati Patata, não importa. O que importa é que, se você cresceu no Brasil, tem uma chance enorme de dar uma risadinha de canto de boca quando ouvir as primeiras notas dessa música.
O título da canção original é Ententanz que, ao pé da letra, significa »dança dos patos«.
A melodia foi composta por Werner Thomas enquanto estava praticando o acordeão – pelo menos é o que dizem as lendas. Bom, para ser rigoroso, Thomas vem da Suíça germânica – mas isso é só um detalhe né!
Dá uma olhada nessa bandinha militar tocando na rua e a dancinha das crianças:
Ou se preferir, confere o que esse professor ~inspirado~ fez com a turma dele em sala de aula:
Bateu a curiosidade de saber o que eles cantam na segunda parte da musiquinha? Bem, fiz questão de copiar para ti a transcrição desse pedaço – é algo assim:
Ja, wenn wir alle Englein wären,
dann wär die Welt nur halb so schön.
Wenn wir nur auf die Tugend schwören,
dann könnten wir doch gleich schlafen gehn.
Traduzindo meio ao pé da letra, fica assim:
Se todos nós fôssemos anjinhos
Então o mundo seria apenas meio bonito
Se nós jurássemos pela virtude
Aí então poderíamos ir dormir já-já
Jingle Brahma Chopp (1991)
Nem todo mundo vai lembrar disso, mas a Brahma lançou em 1991 uma campanha publicitária com um jingle digno de TroféuOhrworm™. Mesmo quem não bebia cerveja nessa época provavelmente vai conseguir rememorar na mesma hora em que ouvir o ritmo.
[O jingle mesmo vai apenas até 0:35. O resto pode ser dispensado!]
Para ter uma noção do que era o Brasil nesses começos de anos 90, rolou até uma versão »chique« do jingle com interpretação de João Gilberto e acompanhamento orquestral.
Pois é – e pensar que as pessoas são capazes sim de vender cerveja sem usar bundas femininas de fora [olha só, que revelação!]
A melodia original vem de uma canção chamada Liechtensteiner Polka, composta por um acordeonista alemão chamado Will Glahé.
Bem, não precisa nem dizer que a música se espalhou por todos os lugares do mundo onde houvesse cerveja e mais de duas pessoas alegrinhas.
Não está acreditando?
Então ouça só essa gravação original:
Can can
Sim, essa mesma que você começou a cantar mentalmente assim que leu esse título.
Você diria assim, direto e de cabeça, que essa música é alemã? Mesmo?
A maioria das pessoas tende a achar que ela é espanhola, mas, na verdade, é um trechinho de uma peça composta por Jacques Offenbach intitulada Orphée aux enfers [Orfeu nos infernos].
Apesar de ter passado a maior parte da sua vida na França, a cidade de origem de Offenbach é
Köln – sim, lá mesmo onde tem a catedral e o carnaval mais maneiro da Alemanha.
Quem olha os figurinos e as coreografias nem imagina que essa música saiu das mãos de um alemão!
Marcha nupcial
A não ser que os noivos sejam daqueles moderninhos que casam em chácara ou em um bar, você tem 135% de chances de ouvir a marcha nupcial do Mendelssohn em uma cerimônia de casamento.
Mas nem precisa ir para uma igreja para ouvir esse clássico. Qualquer pessoa que já assistiu um único último capítulo de novela conhece essa música
Sim, todo mundo já está enjoado, mas pelo menos agora você pode comentar com a pessoa entediada do seu lado que é uma composição alemã também!
Olha, se eu fosse você, daria mais uma chance e ouviria com atenção essa gravação com a Filarmônica de Berlim. É curioso como, às vezes, a gente deixa de ver a beleza das coisas só porque elas se repetem à exaustão:
Com quem será?
Um clássico de festinhas de aniversário brasileiras – especialmente se o aniversariante está naquela fase problemática entre a infância e a adolescência em que “estar namorandinho” é uma vergonha pública.
Bom, às vezes essa fase acaba durando um pouco mais para certas pessoas, é verdade…
O que quase ninguém lembra é que a melodia do constrangedor »Com quem será« é também uma marcha nupcial do Lohengrinn, de Richard Wagner.
Um dos maiores nomes do romantismo alemão mal poderia desconfiar que ia virar hino de aniversário no único país da América do Sul onde o »Parabéns a você« tem quatro versos totalmente diferentes.
Se você quiser fazer graça na próxima festinha e bancar o sabidão, pode cantar em alemão. Aqui está a letra [mas só do pedacinho em questão, é claro!]
Treulich geführt
ziehet dahin,
wo euch der Segen
der Liebe bewahr’!
Em uma tradução aproximada, a letra diz mais ou menos o seguinte:
Fielmente conduzida
Caminha até ali
Onde a benção do amor
vos protege
Que dramático, né? Bem, o casamento de Elsa e Lohengrinn jamais poderia ser tão divertido quanto delatar para todo mundo quem é o parzinho/a parzinha da pessoa no centro das atenções.
Da da da
Mais uma vez a publicidade recicla músicas gringas que nem todo mundo conhece. Dessa vez, foi a Vivo que lançou em 2014 esse jingle para anunciar os benefícios da qualidade do sinal da conexão 4G.
Não sei se corresponde à qualidade do produto de fato, mas é um fato que a ambiguidade do verbo »pegar« foi uma sacada inteligente:
O que a Vivo e a agência nunca iriam te contar é que essa música é de uma banda alemã da década de 1980 chamada Trio. É verdade que o Trio não é lá a coisa mais underground do mundo, mas, para quem não alcançou essa fase, o nome pode soar totalmente desconhecido.
Ich lieb dich nicht
du liebst mich nicht (4x)
Da da da
Pôneis malditos
Ainda no embalo dos anúncios, a campanha da Nissan »Pôneis Malditos« de 2012 também ~se inspirou~ em Wagner para vender a força de tração de carros.
Depois do alvorço causado pelo lançamento da campanha, os vídeos sequenciais da campanha parodiaram a abertura de Die Walküre [A Valquíria] do ciclo do Der Ring des Nibelungen [O anel de Nibelungo] de Richard Wagner.
Se você não se lembra do comercial de cabeça, vamos refrescar tua memória:
A obra original é um belo exemplo do estilo épico e sempre algo exagerado de Wagner. Para você, eu pincei esse arranjo feito pela Orquestra de Sopros de Novo Hamburgo. A instrumentação é diferente do original (obviamente), mas vale bastante a pena conhecer o bom trabalho deles:
Musiquinha do gás
Sem sombra de dúvida, um dos casos mais enigmáticos de publicidade erudita-folclórica.
Quem cresceu em São Paulo (capital e arredores) nas décadas de 1980 e 1990, com certeza conhece a famosa »musiquinha do gás«. É engraçado pensar que o caminho de gás que passava circulando as ruas dos bairros mais suburbanos tocava uma peça de Beethoven –Für Elise.
O caso é bem conhecido do folclore paulistano – como se pode ver em
qualquer cantinho mais informal da Internet – e já até virou tema de humor como nessa música de Wisnik e Tatit:
Quem já teve a experiência de ouvir ao longe a tal »musiquinha do gás«, vai reconhecer a cena imediatamente:
Por Elisa
Ficou tudo tão fugaz
Nunca mais eu tive paz
Nem precisa, tanto faz
Só o que me sensibiliza
É estar vivendo para Elisa
Mas Elisa agora está em todo lugar
Ouço ao longe o seu cantar
E vou correndo encontrar
Nunca está onde eu ouvi
Sempre ?passou por aqui
Foi por lá, foi por ali?
O fato é que, até onde pude pesquisar, não existem vídeos apenas do caminhão tocando a famosa »musiquinha do gás«. Se alguém aí encontrar, faz favor de compartilhar com o mundo ali nos comentários!
Canção de ninar
Mentalize a primeira melodia que te veio à mente quando leu esse título.
Pois é. Ela já é tão famosa que a gente nem sabe o nome dela – bem, eu pelo menos não conheço um nome popular, ao contrário do que acontece com »Cai, cai balão«, »Boi da cara preta« e similares.
Quase todo mundo reconhece essa melodia, mas quase ninguém sabe que está escutando o Opus 49 nº 4 de Johannes Brahms, um compositor alemão do final do século XIX.
Agora confira essa execução com violoncelo e piano e pensa comigo: não é impressionante como há tanta beleza escondida em coisas banais?
O leitor Leandro Ristow conseguiu resgatar a letra da composição original e mandou para nós nos comentários. Por isso, decidi inclui-la aqui para vocês tentarem cantar mentalmente!
Text: Des Knaben Wunderhorn, 1808 (1. Strophe), Georg Scherer 1824-1909 (2. Strophe)
1. Strophe
Guten Abend, gut Nacht,
mit Rosen bedacht,
mit Näglein besteckt,
schlupf unter die Deck:
Morgen früh, wenn Gott will,
wirst du wieder geweckt,
morgen früh, wenn Gott will,
wirst du wieder geweckt.
2. Strophe
Guten Abend, gut Nacht,
von Englein bewacht,
sie zeigen im Traum
dir Christkindleins Baum.
Schlaf nun selig und süß,
schau im Traum’s Paradies.
Fonte:
Germanofonia